Manhã de domingo. Em uma
grande cidade no Turcomenistão, mais de 50 cristãos se reúnem. Eles cantam,
oram e ouvem um sermão do Pastor Mahmud*. Ao que tudo indica, é um culto
normal, mas, para os presentes, isso não ocorre sem perigo. Ser cristão no
Turcomenistão é uma luta.
Como se sobrevive como
cristão, em um país onde a influência da ex-União Soviética ainda é evidente e
onde todos presumem que você é muçulmano? A igreja de Mahmud é um cômodo
alugado no subsolo de um quarteirão de apartamentos. Não há nada que sugira que
seja um prédio de igreja até que Mahmud tira um púlpito de dentro de um armário
e o cobre com um pano, com uma cruz. O culto começa. O som dos cânticos parece
estranho e mudo, embora estejam as mesmas pessoas na igreja, todos os domingos.
A garota na frente do
salão, à esquerda, bate palmas exuberantemente, mas os outros parecem se juntar
sem nenhum sentimento. Como as pessoas de fora, parece que a vida lhes foi
tirada. Todos se mantêm discretos de forma a evitar dificuldades. No Turcomenistão,
não precisa fazer muita coisa para se arrumar problemas. Você pode até ser
multado por não limpar seus sapatos ou por seu carro não estar brilhando o
suficiente.
A língua do coração
Oficialmente, existe
liberdade religiosa no Turcomenistão, mas, na prática, isso se restringe ao
islamismo sunita e, em menor grau, à Igreja Ortodoxa Russa. Para ter permissão
para se reunir como comunidade cristã, a igreja tem de ser registrada no
Estado.
A igreja de Mahmud tem
licença e, então, pode se reunir livremente. “A despeito disso, ainda estamos
sendo observados para ver se não estamos ultrapassando os limites. Pode haver
um infiltrado sentado no meio da congregação. Realizar cultos em turcomeno é um
ato, visto como evangelismo, o que é proibido, assim como possuir uma Bíblia na
língua turcomena”.
Ainda assim, durante o
culto, Mahmud constantemente alterna entre o russo e o turcomeno. “Muitos sabem
o russo, mas turcomeno é a língua que toca seus corações. Meu desejo é que o
máximo de pessoas ouçam a Palavra de Deus e que as igrejas sejam registradas.
Então, as autoridades não mais poderão ignorar os cristãos e simplesmente dizer
que não há cristãos aqui”.
Visitas aos lares nas
áreas rurais
A igreja de Mahmud está
autorizada oficialmente a realizar cultos, mas as coisas são bem diferentes nas
regiões rurais, onde vivem muitas etnias turcomenas. Mahmud tem contato regular
com pastores, dos quais a maioria não possui permissão para se reunir.
Um deles diz: “Minha
igreja tenta se reunir todos os domingos, mas é sempre impossível. Nós nos
encontramos em grupos nos lares. Um ou dois de nós vamos a um vilarejo e
visitamos os cristãos em casa. Mas o controle social é grande e muitas pessoas
mantêm sua fé em segredo. Eles não ousam ter contato com outros cristãos”.
Podemos nos alegrar por
haver, também, um lado bom nessas visitas aos lares. “Algumas vezes, vamos às
casas de cristãos e há parentes muçulmanos presentes durante a conversa. A
cultura turcomena é de se contar histórias. As pessoas gostam de ouvir, mesmo
as histórias sobre Jesus. Elas O conhecem do islã, mas como profeta. Isto
fornece uma oportunidade de falar a elas sobre o Evangelho. Desta forma, as
pessoas também vêm para a fé”.
Dificuldade para crescer
na fé
A igreja de Mahmud
consegue se reunir como grupo aos domingos. Mas, mesmo o pastor tem
dificuldades em manter a unidade entre os cristãos. Julgando pelas aparências,
tudo vai bem e há solidariedade. Durante o culto, logo antes do sermão, quando
chega a hora da saudação de paz, todos se levantam para apertar as mãos, uns
dos outros, e conversar. Mas, a pressão dos controles das forças de segurança e
o temor de fazerem algo errado, mina a confiança mútua.
Além disso, alguns
membros da igreja se recusam a comparecer aos cultos porque outras pessoas têm
diferentes ideias de como os mesmos devem ser conduzidos. Há cristãos que
rompem com a igreja e continuam por si mesmos. Isto é difícil porque há poucos
pastores bem treinados e é proibido fornecer treinamento bíblico. Isto
significa que, com todas as restrições, é difícil para a Igreja no
Turcomenistão crescer na fé.
Alguns cristãos não mais
ousam frequentar reuniões e ficam em casa. Olga* é uma delas. Ela não vai aos
cultos da igreja há meses, e quase não tem contato com outros cristãos. A única
maneira de ver Olga é visitá-la em sua casa à noite. Isto é precedido por um
telefonema cripto para que alguém que possa ouvir não saiba quem estará vindo
ou quando. A tensão é tangível quando a campainha toca, mas a porta não se abre
imediatamente. Primeiro, é feita uma verificação pelo olho mágico para ver quem
está lá.
Então, a porta se abre e
é rapidamente fechada novamente. Na sala, Olga diz como está passando. Tão logo
menciona sua conversão, seu marido se levanta e sai da sala. “Ele não quer mais
ouvir sobre isso”, diz Olga. “Acho que ele ainda é cristão, mas não quer ser
confrontado com isso”.
As lágrimas se formam nos
olhos de Olga quando ela diz que seu marido a proibiu de ter contato com outros
cristãos. “Ocasionalmente, ele me permite me reunir com alguns cristãos que
conheço há muito tempo, mas, na verdade, ele preferiria que eu não tivesse
nenhum contato com eles. Ele teme que seja feita uma busca domiciliar em nossa
casa e ele perca seu emprego”.
Olga se aquieta enquanto
segura as lágrimas. Fazendo uma pausa, de vez em quando, ela continua. “Os
turcomenos se veem como um segundo deus. Meu marido também. A família inteira
tem de obedecê-lo e é por isso que quase nunca eu me reúno com outros cristãos.
Eu entendo seu temor, mas por que ele não me permite ir?” Como muitos outros,
Olga se pergunta como pôr sua fé cristã em prática, em sua vida. Alguns
cristãos turcomenos foram os primeiros em suas famílias a vir para a fé. Eles
não têm nenhum exemplo a seguir e nenhum livro onde possam aprender como
aplicar sua fé.
“Algumas vezes, sinto-me
tão impotente”, continua Olga com uma voz suave. “Como posso dar uma criação
cristã aos meus filhos? Quando minhas duas filhas eram menores, cada um podia
levar algo para a escola o que fosse importante para si. Minhas filhas levavam
livros ilustrados de histórias bíblicas com elas. Mas a professora não lhes
permitia mostrar os livros; se desobedecessem a ordem, não mais seriam bem
vindas na aula. Como posso lhes mostrar o bom lado do evangelho? Minhas duas
filhas adolescentes estão no meio da puberdade e, como todas em sua idade, nem
sempre querem ser observadas por sua mãe. No passado, elas gostavam de ouvir as
histórias bíblicas que eu lhes contava. Agora dizem que já ouviram essas
histórias tantas vezes que não querem ouvi-las novamente”.
Não somente seu marido e
suas filhas dão a Olga, a sensação de que está só, em sua fé cristã. “Outras
pessoas me julgam. Se eu não sacrificar uma ovelha durante o festival islâmico
de sacrifício, as pessoas me perguntam por que não o faço. Então, digo: Alguém
já trouxe o sacrifício para mim. Com isso me refiro a Jesus”, diz ela. “Ainda
que seja difícil e haja muitas coisas que não entendo, por causa de Jesus,
tenho paz em meu coração. Deus nunca me deixará. Ele nunca vai embora e
responderá. É nisto que me apego. Levo tudo a Deus em oração. Através disso,
meu relacionamento com Ele se mantém”.
A mensagem que Mahmud
imprime em sua congregação no domingo seguinte é esta: “Jesus Cristo não veio
para julgar, mas para buscar e encontrar. Nós temos tempo, mas não sabemos
quanto. Hoje é o dia de se reconciliar com Deus. Ele te concederá perdão.
Por causa do que o Senhor
Jesus fez no Gólgota, não estamos mais amarrados às coisas aqui na Terra. A
obra foi feita. Há liberdade em Cristo, mesmo que nem sempre você a perceba”.
Esta é uma mensagem importante, em uma terra onde regras inumeráveis e
regulamentos estão paralisando o país. Quando Mahmud fala sobre este
encorajamento, as lágrimas rolam nos rostos de vários membros da congregação.
“Temos que deixar a Verdade irromper”, continua Mahmud. “E temos de mostrar
isso a outros e não mais pensar que as coisas são impossíveis. Nós temos Boas
Novas para as pessoas ao nosso redor”.
* Por razões de
segurança, todos os nomes neste relato são fictícios.
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